Ocasião

Venho às teclas para retomar as linhas. Essas que assentam em si, palavras que não passam de organizações. Não as capitais, tão importantes neste mundo de cifras. Mas pensamentos despretensiosamente organizados num fundo branco. Momentos imortalizamos na escrita, no afã de conquistarmos leituras. Levamos ou trazemos neles, o resultado de distribuir de maneira única, o alfabeto que tão cedo a maioria aprende.

Volto de um velório, esse evento ao qual te convidam sem dizer claramente para que compareça. Ocasião sempre anunciada por amigos, parentes ou pela mídia local. Assunto que por vezes nos pega de surpresa e com as mesmas palavras de desânimo. Sintomas de nossa própria despedida, que gritam as perguntas tão mal respondidas, que fazemos diante de olhares já não mais correspondidos.

E é ali, em pé, ao lado de um corpo deitado, que repensamos os tantos desejos, tão pouco, de fato, importantes. É quando encaramos naquela face deitada, os apegos a tudo que não levaremos daqui.

Naquela hora, um pequeno filme começa com o dia em que nos entendemos por gente e termina com nossa própria imagem refletida naquele caixão. E em seguida, olhando em volta, concluímos que não se pode afirmar quantos dos presentes terão essa mesma visão, projetada sobre nós. E ainda é possível se perguntar, quantos tiveram essa mesma impressão.

Por um momento deixamos de pensar no que comer, no que vestir, dentro de que carro andar, em que se formar, em quanto dinheiro se quer ganhar hoje e amanhã e depois. Que valor tudo isso tem, na hora de se despedir?

São muitas interrogações. São nobres as reflexões. É grande a dor de quem fica. É grato quem comparece. É momento de dar apoio e demonstrar que a vida continua, mesmo que a própria situação nos tire qualquer certeza. É hora de ser forte e desejar com toda força que o momento permite, que aquele ou aquela esteja a caminho de um belo lugar.