O Deserto Vermelho

Aconteceu que eu estava andando no deserto vermelho. Sem muito rumo. Cada som repercutia a mil pensamentos, inúteis todos. E a mente rondava em círculos que com o tempo, de tão perfeitos, não precisavam mais de mim. Também não eu deles, só os rodava por minha sanidade, mas a culpa me consumia. Culpa minha, de não ter o que erguer sobre os ombros.

Aconteceu que eu estava andando no deserto vermelho. Sem muito rumo. O som foi de um estrondo, e uma onda surda correu na superfície. O mundo balançou. Uma âncora de mil pés caiu do céu e cravou num monte. O olhar que era meu mudou, e todos os círculos quebraram de uma só vez. Mas eu ainda estava lá. Vendo a areia sépia lamber as curvas do metal.

Aconteceu que eu estava andando no deserto vermelho. Um estrondo me fez surdo e vivo ao mesmo tempo. Uma torrente de emoções me encarnou. Era aquele o algo que eu devia ter entre os ombros. Subi então no monte e agarrei minhas mãos na argola de aço. Puxei com toda a força de minha alma, e ela se moveu. Por um instante pareceu que éramos únicos. A força minha era tudo de que ela necessitava, e nada mais.

Aconteceu que eu estava andando no deserto vermelho. Trazendo agora entre os ombros uma âncora de mil pés. Sem culpa, eu sorria como nunca. Era aquele o algo que eu devia ter. E nenhum pensamento foi inútil. E nenhum círculo mais girou.

Aconteceu que eu estava andando no deserto vermelho. Aconteceu que eu estava andando...