Conexão Mística
Creio que essa afinidade, essa doçura que há entre mim e ele tenha vindo de tempos remotos, de uma conexão espiritual delicada e mística.
Nesse tempo guardado em minha memória transcende, havia transfusão e comunhão de sentimentos entre os seres. Foi numa colisão estelar que, por providência do Universo, a seiva vital dele passou a correr em mim, transformando-nos em ‘nós', em um manso regato de ternura serpenteando nossas planícies até desaguar em nosso nascedouro de vida.
Essa conexão fez-nos iguais perante sol e lua, estrelas, campinas, riachos, árvores, flores, e totalmente desconectados de coisas desprovidas de magia.
Morávamos num cogumelo cor de sol encantado. À noite, o dividíamos com fadas, borboletinhas e duendes. Durante o dia, recebíamos visitantes ilustres como vaga-lumes sonolentos, formigas, cupins, pererecas e aranhas donzelas que vinham tecer suas teias em nosso telhado.
Meu beija-flor sabia a língua dos pássaros. Foi com ela que aprendeu a fazer poesias. Em noites de lua cheia, quando a floresta estava toda banhada de prata, ele dedilhava o violão, enquanto pássaros pipilavam em galhos secos de estrelas. Entre um canto e outro, eu beijava lhe a boca só pra sentir o gosto adocicado dos poemas que, em cascata, desaguavam da cachoeira de seu sentir.
Era comum, nesses dias de luar, passarmos a noite admirando o vai-e-vem de formiga-estrelas que vinham dorminhar nos buracos da lua, pois, nesses dias havia maré alta de céu.
Amavámos a vida com tamanha violência que ela nos ardia a boca de tão doce, arranhava-nos os olhos com tanta beleza bruta.
Defendíamos, perdoávamos, outras vezes nos desarmonizávamos. Mas, nunca tempo suficiente pra chegar a ferir-nos, macular nossa aura de pureza.
Eu o tinha arraigado em mim, da mesma forma que ele tinha a mim.
Com o tempo, criamos raízes um no outro, raizes tão profundas quanto as de árvores de cerrado. Assim passamos a tocar o sentimento um do outro em seu âmago. No cais desses sentimentos sagrados, ancoramos nosso amor, totalmente despojados de maldade e nos abandonamos um no outro numa simbiose perfeita, por incontáveis eras.
(Edna Frigato)