Vão as ciriguelas e ficam as saudades.
A sombra cobria o rosto acostado no pé frio da árvore e um leve constante vento soprava no alto, uma colorida e perfumada paisagem..
Eram verdes, amarelas, vermelhas e laranjas. Todas em tons claros e intensos, como numa banca de feira livre, viradas de cabeça para baixo.
Tanto as folhas novas e moles quanto e duras e escuras se mexiam abrindo e fechando e descortinando as frutas com seus brilhos, ainda, em seus galhos longos que desciam da copa como toldo escorregando perto da grama, ainda molhada de sereno.
A respiração ficava calma e a nuvem passava no fundo azul anil querendo ser uma gaivota cinza e pequena. Mas olhar aquelas frutas era quase mais gostoso que chegar perto delas para provar o suco doce que amarrava aos poucos a garganta. Às vezes, escorria pelo peito de criança e manchava a camiseta longe da bronca da mãe.
As “de vez”, como diziam os primos, eram parecidas com grandes azeitonas espanholas e faziam a língua transbordar atrás dos dentes. Era bom comê-las com sal para estalar os lábios com a cara torta e os olhos lacrimejados. No meio de tantos pensamentos, o cheiro do torresmo frito na banha de porco misturado com a lenha do fogão anunciava a hora de lavar as mãos... a pimenta engarrafada sobre a mesa velha de madeira... a vó com o avental meio úmido enxugando as mãos gordinhas...o sol entrando pela porta de madeira antiga... a parede velha descascada com a sombra cortando o meio... o cheiro de manga mais que madura na cesta...a moringa de barro tampada com palha de milho dobrada...o fumo de corda enrolado sobre o chão de tijolos grandes gelados e gastos....a cana cortada esperando a tarde....o moedor sujo de café com resto de pó...o perfume das ciriguelas nas mãos...
Leandro Passos