Viagem ao passado

A paisagem era matizada de amarelo. As folhas espalhadas pelo trilho de árvores gigantescas e envelhecidas, cobriam o solo de Outono. O vento soprava brandamente, agitava os galhos despidos e dispersava o amarelo e as folhas pelo universo da sua mente.

Caminhava sob o piso húmido coberto de saudade. Dirigia-se à velha casa dissimulada pelas ramagens ressequidas, com as janelas perdidas no tempo, e um baloiço, que outrora embalara a felicidade de um amor longínquo.

Luísa voltara ao seu ninho. Necessitava retornar ali para que pudesse entender a verdade de uma vida metamorfoseada pelo tempo, as raízes, a certeza da sua existência. Tinha necessidade de sentir agora, as energias daquele local que fora abandonado algures no compasso da vida.

Entrou pela porta da frente. As dobradiças enferrujadas provocavam um rangido intimidante que lhe causava arrepios. Sentiu a brisa que lhe arrefeceu a face. Hesitou por um momento.

Já lá dentro, o pó que cobria os móveis e as paredes dava ao espaço uma impressão de morte, de deslembrança, de uma amargura insustentável. Contudo, as cadeiras, as mesas, as cortinas e candeeiros mantinham-se intactos, entorpecidos à mescla com o pó e o silêncio. Subiu as escadas. No quarto azul uma cama de dossel.

Num lapso de tempo o passado estava nas suas mãos. A cama, o azul, aquele quarto devotado ao abandono, fizeram com que se despoletasse a catarse que a iria enterrar na mais dolorosa experiência. De repente, a dor da perda estava ali cravada nas paredes, no chão, mesmo no pó que cobria os móveis. A morte estava viva naquele quarto. Aquela morte que impede a eternidade, a mesma que decepa as correntes que prendem as pessoas à terra. As mesmas pessoas que se julgam eternas e que agem como se a vida terrena não tivesse fim. Como se a matéria fosse para sempre matéria. Como se o principal da vida seja o que se tem e não o que se é…

Isabel Fagundes

06/08/07