A MAÇÃ NA CRUZ
O amor não é algo material. Ele é um deus, está no todo. Dentro e fora da gente. Quando ele age no corpo, dando-nos prazer e gozo, é o mesmo.
Temos a triste mania de destrinchá-lo em partes, como quem carneia uma rês para tirar as partes moles, mas o corpo animal tem todos os músculos e suas diferenciações de maciez e sabor.
As partes moles são mais gostosas, no entanto não se desenvolveriam bem se não fossem carregadas pelos cascos das patas.
O amor é um todo, e para que se cumpra esta totalidade, é necessário que seja absolutamente individual.
O amar, enfim, tem que ser capaz de andar e zurrar de teimosia e fúria, porque é do humano ser o sentir de dentro.
O touro – o animal que escarva e berra – à hora do morrer, fenece brigando para se dizer vivo, presente nos poros do animal na vertical.
Porque fora desta posição e prumo só se concebe, nos poros, o exaurir da mais linda fúria possível: o clímax.
Acho que está com medo dos deuses de fora e de dentro. Ou do que as bocas desejosas falam com inveja.
É Semana Santa, eu olho o Cristo por sobre nossas cabeças e a coroa do INRI reluz ao sol tímido.
– Mais um animal vai morrer de amor aos pequenos deuses do corpo nu. À volta, não há fúria.
O mítico está posto: o homem de dentro – o proscrito – acorda e reza um Pai-Nosso...
– Do livro O PAVIO DA PALAVRA, 2017.
http://www.recantodasletras.com.br/prosapoetica/5968390