Ao piano
Preciso grafar no manuscrito mesmo,
enquanto ainda sinto latente no corpo:
Teu gosto.
Teu cheiro.
Teu tato.
Preciso captar
nossa essência tão infrequente,
tal qual no O Perfume,
enquanto o Amor ainda se faz quente.
Sinto a libido no entremeio dos meus lábios.
Na rouquidão no meu ouvido.
No arfar no meu pescoço.
É dele que eu preciso!
Na ânsia de registrar o momento,
receio que as letras se prostrem.
Minha alma tem pressa, como disse o poeta,
pois eu também tenho poucas cerejas na bacia.
Anseio escrever tudo,
porém na verdade não posso revelar nada.
O biógrafo reconheceria seu cheiro,
ao abrir os gomos dos poemas que eu traço.
Suspiro.
Fecho os olhos.
O som do piano ecoa pela casa:
Pachelbel - Canon in D.
A mente divaga...
Posso segredar que vi vestígios
de amor em teus braços?
A mim por ora basta!
E eu que amanhecia e anoitecia
correndo atrás de compromissos,
há tempos penso apenas numa maneira,
num único modo,
de encontrar uma faísca de desejo
também nos teus olhos.
Por que o tempo passa...