Brejal de Prímulas e Estrelas
Encosto o ouvido na concha do tempo e ponho-me a sentir o marulhar da vida num incessante vai-e-vem de ondas esverdeadas com aragem de prímulas nos cabelos, como se fosse um solfejo de Beethoven vindo de um aguaçal de lua cheia encantada com o gorjear das estrelas.
Cresce por cima das cristas das ondas um cardume de notas como o abrir de portas do oceano, entornando meus silêncios, escalando a escadaria de meus rubores de encantar palavras sérias até crepuscular-se em mim e causar incêndios nas nuvens de girassóis que acabara de desabrochar, desbotando o céu até ele ganhar um azul pálido, desses que amolecem os olhos como jujuba em boca de criança incrustada de peraltices.
Algas vermelhas estacionam entre um ninhal de pedras e uma lagoa peregrina emprenhada de rãs escalenas avançando até o poente dos meus olhos, apequenando o horizonte até que ele caiba inteiro dentro do meu bocejo de dormir sonhos esmaecidos.
A noite abre seus olhos de relógio enferrujado coalhados de prímulas reluzentes. Por esse lume esplendoroso adentram coaxos de sapos órfãos e o Brejal do firmamento ganha uma brancura indefinida de garça aninhando-se em nuvens invisíveis.
(Edna Frigato)