Rodo

Nunca dei muita importância aos rodos.

Utilizo-os em raras ocasiões.

Admito, contudo, que o prazer de deslizar a borracha,

Sobre uma superfície lisa,

Criando ondas em qualquer direção

Não é de se desprezar.

O líquido que teimoso foge pelas beiradas,

Parece querer brincar.

Avançamos sobre a da direita,

Voltamos na da esquerda.

E novas ondas se formam,

Insistindo em se espalhar.

Reverências à parte,

Exagerações contidas,

Reconheço:

Existem diversões mais sedutoras.

E um rodo será sempre um rodo,

Insubstituível, sim,

Mas só até a água secar.

Desço pelo elevador de serviço.

Não estou só.

Ao meu lado um feixe de rodos,

Abraçado com firmeza por um auxiliar da limpeza.

Educado e falante.

Entre o vigésimo andar e o térreo, aprendi muito sobre os rodos.

Resistência, tamanho, aplicação.

Tem rodo pra tudo!

“Observe senhor, a qualidade deste produto.

Neste condomínio não usamos qualquer tipo de rodo.

Aqueles que rasgam a borracha,

Soltam o cabo,

Aqui não se compra”...

Confidenciou-me o rapaz que,

Anestesiado,

Afagava cada peça,

Como se fossem cães de estimação,

Ou bailarinos,

A serem cordialmente convidados para

O concerto ou baile de gala do seu trabalho de faxina.

Um pra frente, outro pra trás,

Um pra frente, outro pra trás...

Primmm!! Chegamos.

Com pressa deixo o elevador.

Tinha outras preocupações.

Meus próprios rodos para cuidar...

No mesmo lugar, dias depois, nos encontramos.

Desta vez subindo.

Eu mais calmo.

E ele sozinho.

Mãos vazias,

Nenhum rodo ao redor.

Evitei tocar no assunto.

Contive a excitação.

De rodo eu já entendia.

Pra que mais uma explicação?

Despedimos-nos.

Sai logo antes que ele se lembrasse,

E levantasse a questão.

Elogiando um detergente,

Ou talvez um escovão.

Mas quem não se esqueceu, fui eu.

Antes de entrar em casa,

Contudo,

Passei o rodo na charada:

O amor do artesão por suas ferramentas

É universal.

Mas quem exige bons utensílios,

Não quer apenas entregar um lindo trabalho.

Quer ver a obra admirada.

Chão limpo, parede lavada.

Aquele homem queria escutar:

Parabéns!

E Puxava com o rodo a palavra,

Que só no outro dia,

Eu,

Finalmente,

Falei.