Sede de Nada
Sua face expressava uma rigidez de espírito, com olhos firmes fitava coisa nenhuma no espaço, a visão vadiava libertinando por sobre as linhas dos móveis até bater contra o teto frio e esquecido em tinta branca; mas ele olhava o espectro subjetivo das sensações, como quem vira-se para dentro de si mesmo e quer achar uma saída para fora; e externamente - o ridículo: a imagem estúpida de um encolher de sobrancelhas com olhos abobalhados sem ver nada, mirados para o teto, reprimidos pelo infinito. A grande comédia do homem pensante. Quão inútil é pensar sobre qualquer coisa! Olhava aterrorizado o horizonte de seus pensamentos, estagnado como um lago sereno de águas negras tranquilas; e buscava nesse olhar sabe-se lá o quê, confinado num emaranhado de conceitos e sensações, numa angústia da vida que beira aos delírios de um homem com sede no deserto. Talvez buscasse na vacuidade de si mesmo iludir-se, buscava como a sede busca numa miragem de um lago por entre duas dunas de infinitos graus de areia, a água cristalina…