Copenhague Zero Grau - Galáxia, Passo Cigano

Tu, Mulher, Galáxia imensa, branca de leite, longe no Negror dos Céus. Tu, às vezes, és a própria luz que emana de um ponto desconhecido, centro de algum universo em torno do qual me condenei a orbitar. A luz desse sol se reflete em ti, no teu corpo nu, onde pousaram os brilhantes pássaros de cristal, a beber das gotas do orvalho da tua última batalha de amor. Tu, Mulher, Galáxia imensa, dos cabelos escuros, onde as naves se perdem e não voltam mais, não sabes quanto és poderosa, quanto és Energia, que o fundo negro do Universo, que tudo engole sem perdão, nada pode contra ti nem contra quem estiver contigo.

Mas como és frágil, Galáxia. Às vezes, com um sopro desvio das órbitas todos os teus astros, cometas, planetas, satélites, sateloides, asteroides, que há mais? Faço-te farinha com um sopra dos meus, teus astros se chocam e explodem e perdes o senso, o rumo o juízo, te transformas em mil noites de balões nos céus, quando quero acabar contigo com um sopro dos meus. Teu desintegrar é a minha vingança, porém, por um momento só, porque jamais poderei fugir de ti, nem conhecer, nem dissecar, Mãe, que nasci de ti. Por mais que conheça teu corpo, permaneço insatisfeito. E te destruo com um sopro, que crente que fico, que inútil vingança.

A insaciedade é a Galáxia que mora em mim. Maior que tudo, sem barreiras, infinita, maior que tudo, como o Negror do Universo atrás de ti, ao fundo da tela da astronave que me transporta, atrás dos fios ralos de algodão. Para onde vamos? Quando mergulho o rosto nos teus cabelos, nos momentos da carne, creio viajar a velocidades sem medidas, no dorso de um pássaro sem freio. Quando o estertor consome, é como se, por instantes, houvesse abarcado o Universo, com tudo que se desconhece, mas que se tem certeza de que existe. Ilusão. A Galáxia não se mistura com o Negror dos Céus ao fundo da tela da astronave em que viajo, continuam separados, jamais se encontrarão, jamais nos encontraremos. Sem solução.

Tu, Mulher, Galáxia branca de leite, em ti me continuarei perdendo. Em todas as manhãs macias, quando o sol atravessar os cortinados brancos dos quartos em que dormimos, teu corpo nu resplandecerá de Energia. E os pássaros pousarão em teu corpo, corvos ao avesso, que se atraem pela vida, bicarão teus seios, teu sexo, com carinho, com ciência.

Eu, já desperto, do teu lado, só faço apreciar a oração dos pássaros a adorar a Galáxia que persisto em explorar, já sabendo que não há como conhecer-te, Galáxia, Negror dos Céus, não há Sol que te ilumine. E vago, astronave, sem rota, sem mapa e rumo, buscador, buscador apenas, que não se nasce para outra coisa nesta vida, passo cigano.

(Copenhague, Dinamarca, 27/01/1979)

William Santiago
Enviado por William Santiago em 07/03/2017
Reeditado em 10/03/2017
Código do texto: T5933410
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