RECANTOS DO TEMPO
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Numa certa manhã de domingo saímos ,meu pai e eu, para comprar laranjas.O destino, uma colônia de lavradores a pouca distância de onde morávamos.
Ainda que isso tenha ocorrido há muito tempo, lembro-me nitidamente de alguns detalhes que cercaram aquêle dia.
Uma porteira entre os cedros, um gramado muito  verde riscado  de paralelas de  rodas de carroças e cães aparentemente furiosos vindo ao nosso encontro.Depois, abrandados, seguindo-nos feito  batedores como que  escoltando a charrete que  nos  conduzia.
Saudações,o olhar desconfiado da moradora e aquela casa com paredes descoradas,ainda que das janelas emanasse um vermelho intenso.
Um arbusto florido ao redor da cerca aramada,e seu Jango, meu pai, servindo-me uma laranja sumarenta descascada à canivete.
A  manhã era  morna  e despertava  preguiçosa sob a  fina organza  da  neblina.
Impiedoso ,o tempo, este senhor da razão ,fez de mim um sexagenário. Vez e outra ocorre-me cruzar diante daquela casa ,agora "caídaça" , e ela espreita -me com o mesmo par de olhos vermelhos daquelas janelas .O arbusto que, na teimosia, abre-se colorido em meados de abril, age na cumplicidade com as paredes sem pintura, insinuando-se - a  casa  e  ele - profundos conhecedores de minhas lembranças.
Então, rendo-me  às fragilidades e me dou conta das incontáveis " laranjas "que a existencia  me fez descascar ao longo do tempo e as percebo quase tôdas um tanto amargas, ausentes...
[A vida é permeada de momentos insípidos e conhece o jeito certo de nos privar dos "descascadores de laranjas e seus canivetes"]
Então, ponho-me a revirar o cesto do tempo na busca inútil de algo tão sumarento quanto o fruto que me fora servido naquela manhã distante, de céus  que se  abriam  mansamente sobre  as  colinas ainda  agasalhadas.
Os  olhos neblinados, teimam em disfarçar que isso  tudo  não passa  de...
Pura ilusão! Saudades,nostalgia...


Clic no link abaixo,para ouvir:
https://www.youtube.com/watch?v=f0rEUB3Lbhc

Texto  reeditado,preservando  os comentários no  texto original:
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20/08/2012 20:37 - Lisyt
Somos feito de lembranças. É a lembrança do fruto sumarento que nos dá força para caminhar e não desistir. Abraço e boa noite.
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18/08/2012 15:42 - RobertoRego
Oi, Joel,tava saudoso de você, das lindas imagens da sua terra e das suas memoráveis crônicas, como esta. O cheiro das laranjas e do suco sumarento me deu água na boca, lembrando-me também do meu torrão natal, o Cedro/MG. Aplausos e forte abraço, dileto amigo e poeta. Bom domingo, Joel! ...
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12/08/2012 22:59 - CONCEIÇÃO GOMES
Inesqueciveis lembranças. Bons tempos aqueles.
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11/08/2012 19:23 - Maria Mineira
Joel, boa noite. Lembrei-me da infância ao ler seu texto. Não sei se é só eu que acho isso, mas as laranjas de hoje em dia não têm o sabor daquelas antigas. Eram umas laranjeiras altas cheias de espinhos, meu avô dizia serem de laranjas campistas. Descascadas a canivete também,deu saudades...Um abraço.
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11/08/2012 13:48 - Anita D Cambuim
Joel, boa tarde. Belas lembranças e carinhosa homenagem. Abraço.