Inefável encontro
Andar pela rua, assim, sem destino me faz ir ao encontro do que nem sei que procuro. Minha sólida incerteza, e só a ela devo certa devoção, nunca me diz o caminho, o que me obriga a caminhar.
Os prédios, os jardins sem cuidados, um museu, um ônibus velho e barulhento despertam em mim um rebuliço interno, ai, não suportando o desatino...vou pro café!
Sentado num rústico banco feito de madeira ou numa confortável cadeira estofada, não penso em mais nada. Só o inexorável encontro me anima para esperar a garçonete que chega. Considerando que não me dou o desatino de negar pensamentos que nesse momento me visitam, a chegada da garçonete desperta sensações que não consigo controlar. Reparo no seu andar que ressalta sua sensualidade e beleza, quadril e cintura simetricamente equilibrados o que, certamente, dará a meu pedido um gosto todo especial.
Esse nobre companheiro, um amigo que nunca diz uma palavra, repousado sobre a mesa do bar, é sempre o mesmo. Ali, á espera do primeiro gole, com sua sensual fumacinha...o café invade os poros, vai para o cérebro, e bumba! Aconteceu o Big bang. Nesse breve tempo um frenesi de átomos se chocam e a transformação acontece. É como se o alinhamento dos planetas, por vontade própria e sem previsão de cientistas e "espacialistas", se resumisse naquele pequeno ato de levantar a xícara.
A ele nos entregamos como quem se arruma para o primeiro encontro. Não há expectativas, apenas experiências trocadas entre dois seres que se querem. Um é calado, tudo bem. Mas é o outro que lhe dá existência. Compartilhar desse momento único é tão indescritível quanto revolucionário, principalmente, numa época de toques e relações tão fluídas, que deter-se para um café é transformar o opressor esgotamento da metrópole no inefável encontro do café com seu apreciador.