Razão
Hoje o dia não amanheceu. Esqueceu-se, acanhou-se, desistiu-se e foi-se embora para Passárgada.
Hoje o sol não aqueceu o vento, não despertou os ninhos e nem pingou o café no bule. Hoje o sol contrariou o sono, cujo qual não ouviu, sequer sentiu, o batuque frenético da ansiedade cotidiana.
As janelas hoje giraram de modo incomum: numa dança elaborada, sofisticada - diria até que de roteiro em mãos - riram de mim em meu mais amargo instante. Riram do cabelo enliado e da soneca do despertador, riram dos raios que não lhes escaparam às frestas, riram da névoa pacífica de outrora e que ainda não lhes transpassara os dedos. Se fizeram maior que o dia, se fizeram maior que a mim.
Ontem eu me vesti de razão. Hoje eu acordei sozinha.