Estilhaçada

De volta aos velhos hábitos, notou como é engraçado o vazio das coisas. Nada faz sentido, nada parece normal.

Há amor e saudades transbordando dos olhos, há calcinhas e camisetas deixadas de lado por muito tempo, há cigarros esquecidos no cinzeiro e há lembranças.

Lembranças do que não foi, de uma vida plena que não viveu, de coisas que não fez e fatos que não aconteceram.

A única coisa que faz sentido é a dor de perder o que mais amou em toda a sua existência.

Mas como se perde algo que nunca se chegou a ter?

Ahhh a realidade é tão cruel! Como é difícil imaginar e sonhar a vida toda com algo que existe, mas que jamais será para ela... Apenas uma vida de verdade, plena, não a sua sobrevida.

Cansada de sobreviver, entrega-se a Morpheu, acreditando que poderá sair de si e permanecer tempo o bastante para conseguir não voltar, mas não acontece; ela sempre acorda.

Faz planos e mais planos, traça rotas de fuga e todas elas a levam para o mesmo lugar: um lugar que jamais será dela.

Se gritar quebrasse as barraeiras da dor, nunca se calaria e o som ecoaria tão alto que os que o ouvissem poderiam sentir o que ela sente.

Sente-se transparente, como se não a enxergassem.

Apenas uma vidraça no caminho das pessoas, um pouco embaçada talvez, que faz com que se desviem para que não se quebre.

Na verdade, tudo o que ela gostaria era ser estilhaçada por fora, já que por dentro, restam apenas os cacos.

Isabel Cristina Oller
Enviado por Isabel Cristina Oller em 22/09/2016
Reeditado em 22/09/2016
Código do texto: T5769501
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2016. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.