Damas da Noite

Nasci de ventre pobre

No chão de viaduto, gritei

Eu vivia, eu nascia, eu existia.

Cresci entre carros e sons de buzinas

O asfalto, meu quintal, era só meu.

Nas noites frias

Dormi velado pela lua;

às vezes um prato de sopa aquecia o corpo,

mas não a alma.

Minha mãe, em tudo amável e carinhosa,

me ensinou que a vida é uma estrada,

às vezes tem muitas pedras,

mas não são intransponíveis.

Sou assim

cidadão pobre de bens;

rico de mãe.

Se nasci pobre de bem

Não sinto falta de um nada.

Do poeta urbano

colhi a amizade

e o amor pela palavra.

Ah,

quem me dera saber

que a poesia nasce de várias formas:

um olhar, um gesto, um pensamento.

Assim cresci,

entre carros, buzinas, poetas,

prostitutas, gatunos e velhos sonhadores.

Ah,

Aurora minha que não chega.

Que os bares fechem suas portas

para que bêbados e boêmios

voltem às casas e dormem o sono etílico

tão desejado qual donzela numa ilha deserta.

É noite ainda

e as meninas que transitam pela vida

Balam nos seus braços homens tristes e carentes.

Amanhã o sol dará sua graça

e as meninas não estarão nos muros

e praças esperando outros clientes.

A noite é delas

porque de dia, de dia

reina a hipócrita etiqueta da civilização.