TEMPO É DINHEIRO

"Tempo

é dinheiro,

perdido".

Pensou atento

abaixo do coveiro

o falecido:

Como ponteiro

rodando sem parar

o tempo inteiro

sem sair do lugar,

em volta do círculo

do relógio próprio,

fiel ídolo

como fã do ópio,

como Pernalonga

atrás da cenoura

na busca que prolonga

o efeito da papoula...

da ampulheta, sou areia

do relógio, a engrenagem

o momento que escasseia

ou o vento de passagem...

Pois então:

Tempo é divino,

disse o vigário

em desatino

temporário.

Tempo é bão,

disse o caipira

na sua lira

de paixão.

Tempo é grana

bradou o falhido

de olho cumprido

voraz e sacana.

Tempo é acorde

disse o maestro

e milorde

em seu nobre gesto

em som discorde.

Tempo é metáfora

tempo é alegoria

disse a poeta

em sua anáfora

em desarmonia

e prosa repleta.

Tempo é maré

Falou-me o pescador

com toda sua fé

pois jurou de pé

em tom de labor.

Tempo é arte

no olhar do artista

de sua parte

um olhar simplista

de grandiosidade

minimalista.

Tempo é florescimento

na voz do jardineiro

um broto desabrocha lento

enfim o primeiro

da-se o nascimento

enfim por inteiro

e murcha no momento

do surgimento

do floreio.

Tempo é carrasco

argumentou o político

depois de um fiasco

num discurso mítico

deixando com asco

o povo acrítico.

Tempo é ilusão

disse o mentiroso

com sua voz de trovão

e ar misterioso

pois por dentro doloroso

sem própria opinião.

Ele pode ser tudo

pra cada um, oposto

seja o mundo

ou um rosto,

só não creia

na história

e no mito

da glória

de estar inscrito

no verso

e segredo

do universo

como se o enredo

da vida

e nossa escolha

fosse um brinquedo

escrito numa folha.