À SOMBRA DO CAFEEIRO

Desde o clarear do dia, equilibrando-se numa escada, derriça com as mãos os grãos de café, é uma tarefa rotineira de pé em pé, de equilíbrio em equilíbrio, até o fim do longo dia, esse café derriçado sobre uma cobertura de plástico sob o cafeeiro, que depois é ajuntado em sacas no fim da tarde. É a lida diária de todo trabalhador como ele para ganhar o pão de cada dia, o sustento de seus entes queridos que esperam, à tardinha com uma comida quentinha e um abraço ao adorado e “idolatrado” pai.

Na hora do almoço, a comida é requentada numa singela marmita, minguado e pobre, que em pouco tempo devora . Já exausto, em poucos segundos recosta-se sob a frondosa sombra do pé de café, pega no sono e logo sonha que está no regaço de sua mãezinha, já falecida, que o abraça e acaricia e que ainda é um menino, franzino, sonha também com a escola que não frequentou, com o brinquedo que nunca ganhou. Sobressaltado, com gritos, desperta, a hora do descanso acabou.

Depois de um dia de trabalho insano, na colheita do café maduro, o apanhador José e seus colegas de faina, exaurido sob o escaldante sol de verão, com seus raios fúlgidos a penetrar na crestada pele, já enegrecida pelo tempo, com as mãos feridas e ardentes, faminto e sedento, quase desfalecido, com o cansaço do corpo e da alma, pela vida sofrida que leva, e à tamanha estafa da dura jornada, a mente confusa, quase sem força para subir no caminhão e ir para casa.

Essa é a vida de um trabalhador rural, que vive exausto, com um escasso salário, que sobrevive de “brisa” e de feijão aguado e de arroz de terceira e quebrado, quase esfarelado, morando num casebre, sem conforto e telhado de zinco, sem agasalho para o inverno, cobertores que são trapos velhos que nada aquecem. Noites mal dormidas, alma ferida, entristecido, sofre calado, impotente, com a vida dura que leva, sente-se como um “frustrado e fracassado”pai.

É a dura realidade de um sofrido e mal pago colhedor de café anônimo, que proporciona aquele cafezinho quente, para o nosso deleite, em nossa casa para todos nós.

"Que todos os governos olhem com carinho para todos os trabalhadores , especialmente pelos rurais do nosso país"

Miguel Toledo
Enviado por Miguel Toledo em 20/06/2016
Reeditado em 10/07/2018
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