Madrugada de crack
Na madrugada a criança fumava crack nos quadriláteros do desespero do centro da cidade. Parecia em curto circuito, alheia
ao vento que vindo do mar, soprando aflito por todo o lugar, a fumaça dos cachimbos acesos nas vielas, meus olhos torturados pela indignação da admissibilidade do impeachment, encontraram os seus olhos de loucura e você riu como se houvesse terminado a sua procura, intuindo a minha fissura pelo caos, como se os violinos demenciais de Paganini, te acompanhassem na sua base percussiva feita por berimbaus.
A criança que fumava a pedra no cachimbo, rumo ao inferno, ou rumo ao limbo, não construíra explicações sedutoras para as auroras químicas das quais era ela própria a autora, , feitas as de Nagasaki, ou Hiroxima, onde apenas sobreviver já era uma obra prima, então deixava acontecer as noites e os dias, em sua inexorável autofagia.
Até onde alcançavam as minhas lembranças, encontrava dentro de mim aquela criança, que perdera completamente todas as possibilidades de felicidade, que não tentara transformar em realidade.
Talvez não faça sentido apontar caminhos aquele que se confessa perdido, mas, mesmo em uma trajetória recheada por espinhos, tentava ao invés da enfermidade, buscar com palavras e atitudes, signos para a felicidade, de uma maneira tão definitiva, que mesmo um tsunâmi jamais mude, essa irrefreável superação dos abismos da vida.
Barthes.