Dentro da noite escura e fria

Dentro da noite escura e fria,

perambulamos com alguns farrapos no corpo.

O moço passa por nós, indiferente, olhos voltados para uma tela reluzente de um belíssimo aparelho celular.

Ri de uma realidade virtual, banalidades do mundo contemporâneo.

A moça que o acompanha esquiva o olhar

da miséria que não acredita estar presenciando.

Não. A noite fria e nebulosa desceu. Já não enxergam seus irmãos.

O casal busca refúgio em um abraço apertado. Ela, sensibilizada, quase volta o olhar. Mas, com receio de encarar cena tão inquietante, continua representando seu típico papel de burguesa "não tenho nada com isso".

Não era necessário muito. Uma palavra era o que nós queríamos.

Mas nunca nos veem. Nunca nos dirigem uma palavra..

Estão sempre apressados. Olhos atentos à realidade virtual. Ou extasiados diante das vitrines e das promoções milagrosas.

"- Pai, por que me abandonaste?"

Vencido pelo cansaço, pela fome,

sento-me debaixo da marquise do Banespão.

Pouco ou quase nada resta a se fazer.

O corpo entanguido, em posição fetal, lentamente vai sendo tragado pela escuridão.

Os últimos versos que balbucio são pouco conhecidos:

"A noite anoiteceu tudo.

O mundo não tem remédio...

Os suicidas tinham razão...."

As pálpebras pesam e a alma flutua sobre a cidade, a cidade que não para.

As luzes se apagam definitivamente.

Mas "o sol há de brilhar mais uma vez

A luz há de chegar aos corações

Do mal será queimada a semente

O amor será eterno novamente

É o juízo final

A história do bem e do mal

Quero ter olhos pra ver

A maldade desaparecer

O amor será eterno novamente

O amor será eterno novamente"

Otávio di Sábatto
Enviado por Otávio di Sábatto em 15/06/2016
Código do texto: T5668259
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