A ligação mais importante da cidade

Um telefone sobre a cômoda empoeirada começa a tocar. Ele se levanta, caminha com certa dificuldade devido ao tempo de inércia sobre o colchão e atende:

— Alô,

— Oi,

— E ai, está melhor?

— Não, ela me ligou agora, dizendo que já não me aguenta mais.

( um silêncio)...

— É complicado, e o que você fez?

— Disse que compreendia, fiquei quieto e ela desligou o telefone.

( ... )

— Eu ainda me lembro quando você à conheceu, você chegou a me dizer que nunca havia sentido algo assim. Eu achei que tinham tudo haver, todos diziam que vocês se davam bem.

— Eu não consigo entender também, tínhamos tantas coisas em comum, agora estou perdido.

— Aguente firme, as vezes não existe razões,

— Estou sem rumo agora, não sei como vou viver.

— As pessoas só se encontram quando perdem seus rumos por algum tempo.

— Mas quanto tempo isso pode demorar?

— Se perdeste o seu rumo verdadeiramente, pode demorar meses ou até anos,

( outro silêncio )

— Acho que preciso ir a um psicólogo,

— Eles não vão te curar, eles lhe deixam melhor por um tempo, mas não vão te curar, se não você não volta mais lá.

— Deve ser por isso que as pessoas fazem centenas de sessões com as pessoas,

— E certamente ganham muito com isso.

— Então o que eu faço?

— Aguente firme,

— Como?

— Sai dai agora, essas paredes vão engolir você, não está vendo que pensa nela toda vez que fica ai sentado?

— Acho que tem razão, mas para onde eu vou?

— Você pode ir para qualquer lugar dessa cidade, aqui tem de tudo, desde igrejas até as boates, vá para onde se sentir melhor.

— Acho que não devo ir para boate.

— Também acho que não deve.

— Talvez um bar?

— Não é uma má ideia, talvez encontre alguém para conversar, os balconistas sempre estão dispostos há lhe ouvir.

— Porque não vem comigo?

— Não posso.

— Mas porque?

— Você está desesperado, você me ligou e eu já disse o que tem que ser feito, agora depende de você. Não posso lhe dar os ombros para sempre.

— Tem razão, obrigado por me ouvir.

— Todo mundo precisa de alguém em um momento de desespero, você não é o único a perder o norte nessa cidade, posso ouvir daqui os corações chorando.

— Corações foram feitos para chorar?

— Não, corações são feitos para jorrar sangue, quando mais sangue é jorrado, mais vivo você está.

A ligação caiu.

Ele não soube se foi um corte na linha ou se o telefone foi desligado propositadamente. Não importava, ele não retornaria a ligação. Então se levantou, sacou seu casaco, colocou o chapéu e ascendeu um cigarro. Desceu as escadas, olhou para o porteiro do seu prédio, era o mesmo, trabalhava ali há 15 anos, parecia que sempre estava com a mesma cara.

Acenou com a cabeço,

em um ato como se tudo estive bem.

Deu sinal para um ônibus, mas não viu qual era o seu destino,

Isso era uma coisa que já não importava mais.