SE O TEMPO FOSSE DINHEIRO

É certo que estaria no limite do crédito, e a estourar o cheque especial. Provavelmente pediria um empréstimo, e teria de arcar com o crescente prejuízo. Perder tempo para pagar o tempo perdido. Contaria segundo por segundo, e veria os juros crescerem… Lembraria de penhorar os sonhos, e hipotecar o futuro; depois certamente iria gastar tempo arrancando do tempo mais alguns segundos, e provavelmente deveria até mais, acumulando gastos, no desgaste de não dar tempo ao descanso.

Haveria de pensar em mover mundos e fundos para me livrar de tal desgosto, olharia para extrato bancário, e engasgaria amargo, com o gosto da velhice prematura. Provavelmente perceberia que os fundos movem os mundos, e trocaria de sonhos como quem troca de roupa; buscando assim guardar um pouco mais de juventude.

Ser um cientista? Um sonho muito caro. Talvez escalar… Existem tantas alturas em desconto, daquelas com a vista em saldão. Mas o risco não vale o preço, e num só xeque poderia pagar com a vida. Não há em vista senão, aceitar uma vida mais modesta e cuidar deste meu cotidiano. Poupar aqueles minutinhos de sono, e dosar as alegrias e tristezas; ser daqueles que segue o relógio a risca. Isso tudo custa muito. Caro demais para um reles servo do tempo, que a tudo custa, e a qualquer momento pode dar calote, pagando com o cheque sem fundo.

Me restaria a falência… Acataria as leis do abuso, e a obscuridade do devedor. Não poderia roubar do tempo, e não se pode confiscar, a pobre existência, de seu escravo. Seria um marginal, e deixaria de pagar a dívida. Alegaria pobreza, e passaria a viver das migalhas. Fragmentando os minutos do que sobra ao mundo, e construiria meu mundo com fragmentos de sobra. O que mais preciso? Talvez não o preciso de um relógio de ouro vivo; mas o que de fato precisaria para me fazer vivo. Triste tempo.

Talvez já tivesse nascido mau pagador, pois devia para o tempo assim que tomara do infinito, a finitude da existência. Agora devo ao banco. Devo por desde sempre, correr atrás do tempo; o tempo futuro. Andando a passos tão rápidos, que acelero o Presente, na cobrança de ver o que virá, mais de perto. É tudo tempo perdido, me sinto ainda mais atrasado. Devem ser os juros. Os juros de quem jura. Os juros de quem jura contra o tempo, ser aquele que vira a ampulheta, e enfim, gozar do efêmero, na atemporal Memória.

Seria naufrago dos novos tempos, numa barca sem Destino. Vagaria pelos turbilhões do Momento; e me perderia na sutil vicissitude da vida. Um Eremita. Pularia de tempo em tempo, fugindo dos compromissos, do senhor cobrador e de suas contas. Fugiria da ira do Deus Chronos e assim não haveria de mais de ver Presente, Passado ou Futuro. Não haveria sequer, Tempo. Então gritaria: “Sempre em frente! Não temos mais tempo a perder…”. Teria meu próprio tempo, num tempo que nada valia. Um tempo que nunca existiu. Minha pequena ilha: “Carpe Diem”.

Hernâni Arriscado - Se tempo fosse dinheiro…

Hernán I de Ariscadian
Enviado por Hernán I de Ariscadian em 02/06/2016
Código do texto: T5654462
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