Zefa
boneca de pano negro
como alta noite
pintada por mãos já cansadas
da lida de uma vida
de terna avó, sem restrição
linha a linha costurada
cada ponto com um conto de carinho
em cada miçanga
dedinho de prosa
em cada retalho da roupa
cheirinho de alfazema
presente sentido, ganho como prêmio
de bom grado, pelas brancas mãos
de uma pequena boneca-menina alva
que desconhecia o mundo segregador
e qual não foi sua dor
ao notar que suas amigas
igualmente cândidas
com suas bonecas neves
de olhos azuis, qual turmalinas
com sua boneca Zefa,
não queriam brincar!
hoje, uma boneca-mulher crescida
pergunta-se em que momento da vida
inicia-se o apartheid...
será que neste mundo
só há lugar para Barbies
com cinturas finas e trajes de alta costura
que não coadunam com Marias e Zefas,
feitas de retalhos, miçangas e pontos feitos à ternura,
por enrugadas mãos de um ser com um enorme coração?...
São Paulo, 01.05.07