Devaneio
Era tamanho o meu desespero. Meu coração batia absurdamente rápido, todos os dias já acordava acelerada. Bebia o café, fumava o cigarro. A cafeína e a nicotina eram as companheiras que me salvavam da angústia de não sentir tua presença, no orvalho gelado daquelas manhãs. Todos os dias meu despertador tocava às cinco horas em ponto. Se eu pensasse em algo que não fosse minha fria rotina, caía no abismo da melancolia de não tê-lo para aquecê-la. Acho que essa é a pior parte de ser poeta: não se conhece o amor, mas sim o sofrimento. E o meu era daqueles que ficavam ali, esperando o momento, o ímpeto de um devaneio meu para gritar: “Eis me aqui. Sinta. Sinta a minha dor. Traga-me tuas nuvens escuras chamadas lembranças. Mas não derrube uma lágrima, corra para os papéis.” E ficava aquela sensação, de ter algo na garganta querendo sair. Porém a única coisa que se manifestava eram meus dedos trêmulos, ousando escrever algo, aquilo que nunca seria lido por você. É latente a minha dor, é sim. Mas lateja na calada, na escuridão do meu quarto, ou no metrô quando eu volto do trabalho. Meus lábios abriam para beijar-te, mas agora se mantém fechados até para sorrir, em luto. Transformo-te em prosa e poesia, em lágrima cristalina úmida em meu travesseiro. Mas nunca poderei transformar-te em meu amor novamente.