Um porta retrato velho na cabeceira da cama

Pensei em procurar o amor que jurou-me numa dessas centrais de achados e perdidos, espalhadas pela cidade do desespero que é meu coração de sequelas.

Reduzo-me em ser poeira impregnada nos móveis do quarto. No meio das noites vazias, acordo para beber algum vinho barato que me lembre seu gosto e alivie-me dessa amargura. Não abro mais a janela do quarto por medo de encontrá-lo em outros rostos num delírio de embriaguez.

Na ânsia de ser morada acabei sendo poesia de instantes nulos. Um porta retrato velho na cabeceira da cama, com a foto apagada que não interessa. Reticências. Papel de parede pra cobrir hematomas de sucessivos “outros”. Retalho de inutilidade. Palavra marginal e sanguinária. E o resto ... silêncio.

Tenho alma de palhaço no fim de tarde, e linhas de expressão precoces advindas de ausência e tédio. Vomito borboletas mortas enquanto gotas de orvalho precipitam-se em meu olhar e formam um córrego sôfrego.

Sinto-te nos sussurros ligeiros do vento.

Recomponho-me com seu sorriso anunciando a primavera e me trazendo flores com seu cheiro. Jardim de lua e estrelas.

Deixe-me a sós.

Hellen Leandro