Paisagens da Alma V
Vejo pela janela o fundo azul do céu vazio, nuvens passam vagarosamente esquecidas para lugar nenhum, calmas como um sono profundo. A tarde vai se esquecendo num movimento mudo que, se não fosse pela santa indiferença em que me encontro, angustiaria-me a alma, inquietaria-me com a monotonia indiferente com que a vida se esquece de tudo. Faz muito calor. O sol é quente e não escolhe onde derramar sua luz, aos teus olhos tudo é o mesmo. O mundo está vazio e silencioso nesta tarde. O sol quente estala a mamona em algum lugar que desconheço, o boi muje sem que eu ouça, os transeuntes anônimos da vida que passam sem que eu os veja, passando todos esquecidos de mim também que aqui escrevo.
Levanto-me da cama e debruço os cotovelos sobre a janela, observo o silêncio que se oculta por trás dos barulhos do mundo, e como se pode ter tudo quando compreende-se que não se tem nada. Os pensamentos afastam-se repentinamente e vejo o vazio destacar-se por sobre as formas, linhas e contornos. Esqueço-me nesta tarde de habitual monotonia, absorto no nada disso tudo. Fico a dormir o sono da vida.