ANTÍPODA
Outro dia
numa noite parecida com essa
fui conduzido dentro de um sonho
e nele uma serpente que perdera o veneno
me dizia a verdade e sorria triste
estendendo o seu olhar para o distante
como se mostrasse um real perigo.
Entre arbustos na escuridão sem cor
outro olhar nos espreitava silencioso.
Uma áspide venenosa armava bote.
Neguei o aviso da primeira cobra,
passei adiante e encarei a vastidão
- nada temia na órbitas ocas pestilentas.
Mas de repente do fundo do sonho
uma nesga de luz surgiu enquanto
os olhos da víbora ficavam da cor do céu
- dei-lhe espaço a meu lado e logo atrás comigo ela partiu.
Acordei, a vida passou como sonho,
só mais trade soube o que era amor.
E soube o que era amor quando senti ligeira dormência no peito,
a primeira doce e cega mas verdadeira cobra companheira
fora apenas mensageira do Amor incrustado nas presas da segunda
- esta que ainda vai comigo para a vida inteira.
*
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Baltazar Gonçalves