Uma toada triste
Pela janela entreaberta
Uma toada triste invade a casa
Uma neblina rala de outono, teimosa
Insiste na luta de ofuscar o resto de luz da lua...
Luzes apagadas nas janelas
Retrato do nada!
Apenas a toada triste
Gritada com ódio, tristeza e desilusão
Por uma voz rouca
Desafia o silêncio da noite.
O cenário é um campo minado pro meu desvairado coração
Que anda desfigurando meu rosto
Limitando meus passos
Emudecendo-me
Sorvo um gole de algo que queima a garganta
Enquanto a canção que vem da rua me rasga o peito:
“sempre só, eu vivo procurando alguém,
Que sofra como eu também,
Não consigo achar ninguém!”
Penso em fechar a janela
Tapar os ouvidos
Ligar a TV pra cobrir o som,
Mas não o faço
No fundo eu quero sentir as punhaladas de cada frase
Me atingindo o âmago do ser;
“a luz negra de um destino cruel,
Ilumina um teatro sem cor
Onde eu to representando o papel
De palhaço do amor”...
Luz negra
Destino
Teatro
Palhaço
Amor
Palavras chaves em minha sina.
A neblina cessa
Consigo ouvir minha respiração pausada.
O cantor melancólico parece ter acabado a canção,
E como um bêbado que precisa da próxima dose
Me dirijo à janela, buscando talvez mais um pouco daquela voz
Daquela tristeza
Daquela tortura sentimental
Ou talvez eu esteja buscando a mim mesmo em outros tons...
Um dedilhado choroso e lento se faz sentir
E a toada triste se espalha pela rua deserta
Mas parece encontrar somente meus ouvidos desarmados
“sempre só, e a vida vai seguindo assim...”
Minha bebida acabou, preciso de mais. Mas não posso buscar agora.
“não tenho quem tem dó de mim”...
Há quanto tempo eu não encontrava poesia na solidão
Beleza na dor, e prazer no sofrimento;
“eu to chegando ao fim...’’
A lágrima corre sem avisar
“Eu to chegando ao fim... ’’
“eu to chegando ao fim...”
A voz rouca se apaga como uma vela sob a chuva;
Silêncio!
...volto à vida do vazio da casa,
Mais do mesmo,
Silêncio e solidão. E eu não tenho fluoxetina.
Eu to chegando ao fim!