Luzes de Dentro
Na casa de minha infância, nunca brilharam as luzes artificiais do Natal. Penso sobre isso, enquanto admiro as cores vermelho-sumidas do horizonte que acaba de encobrir o brilho do astro-rei. Meus olhos contemplativos se enchem com a revoada dos pássaros que pinta de negro o céu que cobre a minha casa de hoje. Sem querer, e sem que me ressinta disso, levo adiante a antiga tradição. Continuo a preferir as luzes do alto, porque foi assim que meus olhos foram acostumados. Não sinto falta do matiz metálico das mil e uma bolinhas de plástico. E agradeço por isso. Se houvesse sido diferente, talvez meus olhos não tivessem aprendido a ser procuradores dessas ímpares belezas que só se revelam na inversão da claridade (que ofusca a realidade do que somos no escuro). Daqui há alguns dias, sei que perderei esse privilégio, porque todas as tomadas estarão apontadas contra os meus olhos. Casas, janelas e árvores piscarão sobre a minha janela as verdades deste mundo que se arrasta feito mariposa para a luz. E eu vou fechar os meus olhos para ver o sol se pôr.