A PÉROLA OCULTA

O lirismo de louvor à condição humana – por ser o canto estético que deflui da natureza do amar – possui nuanças diversas, matizes, peculiaridades inesperadas. Pode começar nas pálpebras maquiadas e se adentra aos olhos, que são o vislumbrar escondido, misterioso, codificado (tal qual o poema) no seu requintado formato de pérola oculta, visual plástico e imagético, linguagem a revelar-se pela subversão da palavra em seu sentido original, fazendo do poema uma peça autonômica, única – que vale por si – ao nada vinculada, niilista, sem compromisso para com o mundo dos fatos. Pura linguagem estética de ocasião e gozo. Desta sorte, o nascimento decorre do universal desejo de sermos bonitos, de olharmos o mundo com olhos doces e dirigidos ao horizonte dos sentires... Mesmo em perceptível rarefeita formosura, corporifica-se a ilusão: felicidade dentro do olhar daqueles que amam além do que é tido, havido ou sonhado. O sentir-se bem-visto para quem se orna da aparente beleza. O visível para que a borboleta nasça pronta para o voo a um piscar de olhos. Ou a pérola dentro da ostra, tímida, protegida.

– Do livro O PAVIO DA PALAVRA, 2015.

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