Poeminha com asa
(Para meu tio Tomaz, in memoriam)
Todos estão partindo em pássaros transmutados.
Tenho uma saudade em estado bruto.
Uma vontade de ir também.
Voar atrás... Voar em bando.
Os cabelos brancos de meu tio Tomaz
Ainda estão entre meus dedos de criança
Trocados por moedinhas que não valiam nada,
Mas que me eram pagas por ele como um afago.
Sua chegada à porta de casa,
Soletrando "pixaninha", como costumava me chamar,
Ainda ecoa em mim.
Prendi o choro.
Aguei a despedida para desafiar qualquer certeza deixada pela morte.
Ainda posso vê-lo com sua camisa surrada,
Máscara no rosto,
Cortando, costurando, contando e embalando
Os fardos de flanela
Que ele fabricava sem cansar.
Posso até me lembrar dele, deitado, caderneta na mão,
calculadora ligada, me mostrando as saídas e entradas daquele seu negócio.
E eu, ali, olhando a cabeça toda branca, que eu já não catava,
Mas que, para sempre, estaria pousada no meu colo de menina,
Como se o tempo nunca pudesse parar para nós.
Por isso, hoje, somente agora,
15 dias após o anúncio de sua ida,
Seguindo voo como a justificar a imensidão que paira sobre mim,
Em meio ao sol e ao azul,
Consigo usar os dedos para catar letras,
Na esperança, quem sabe,
Que ele me dê alguma moedinha
Capaz de me afagar na sua falta.