Um dia... há de ser

Sua beleza e excentricidade encerravam-se em si mesma. Horas frias da madrugada, pela cidade a vagar, pelas alcovas a entrar. Era dona de uma beleza rara, dotada de tons escuros e amargos.

O afago que a desejava, a boca que a tomava, o corpo que lhe reclinava. Tantos eram os rapazes, tantos eram os prazeres. Onde passava se fazia notar, seu esplendor era de matar.

Recebia elogios, flores e pedidos. Ainda assim seus olhos inexpressivos perdiam o brilho a cada piscar. Sua janela, sua companheira de espera, espera por algo, que para ela não existia.

Seus encantos, tantos e tantos. E seu pranto, sofrido pranto. De dama vistosa que nunca seria amada. De mulher independente que no fundo não era respeitada. De admiradora de muitos que ao fundo de uma bela imagem não passava.

Diziam-lhe os rapazes, que seus gestos eram fugazes, ferozes e selvagens. Efêmera era sua passagem, na vida de cada moço, cada jovem ou ancião... Ninguém a guardava, não. Era dama exótica de palavras bem colocadas, era moça irreverente de olhar atraente, era garota inocente e era mulher madura e reluzente.

Para amores rápidos de tudo servia, para se ter ao lado a jóia, a fantasia, para se deliciar em sua alcova a dama servia. Para amá-la ninguém a queria.

Sentava em sua janela e pensava chorosa: "Que vida é essa, sou bela, formosa! De troféu me fazem bem, mas de esposa...? oh morrerei sem... Sou um pavão, um enfeite, uma mostra. Sou uma obra de arte, um quadro ou aposta. Sou o ouro no anel do barão, sou a seda da gravata do homem polido, sou a mulher ao seu lado que lhe faço brilhar... Mas haverá um dia alguém de me amar?".

Noite adentro a dama esperava, pela noite fria andava depressa. Procurava carinho no braço de estranhos, procurava um brilho em seus olhos castanhos. De nada valia ser tão subversiva, tão livre e tão decidida.

Se todos os seus casos na mesma frase acabavam: "Minha esposa me espera, não posso deixá-la. Você é incrível alguém virá para amá-la.".

Era aceita. Era eleita. Era perfeita. Ninguém a rejeita. Ninguém a vê além do que se pode. Os preconceitos haviam a jogado no limbo. Onde os homens passam e admiram, porém nenhum a estenderá a mão. Era só ela e seu vazio coração.

Era uma mulher exótica e por isso sozinha. A beleza que se encerra no mesmo instante em que admira.

04/02/2014

Bi Andrade
Enviado por Bi Andrade em 26/11/2015
Código do texto: T5461982
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2015. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.