Amor em Bossa

Apaixonar-me por uma música, ouvi-la até a exaustão mental, fazer com que todos os amigos a detestem e odiá-la logo em seguida... domino bem essa arte. Acredito ser um mecanismo funcionando incorretamente, uma dificuldade de me conter, deixar que as coisas tenham seu tempo certo. Amo no volume máximo, com o som mais potente e sem fones de ouvido, amo com a pressa dos que sabem que nada é pra sempre e por terem tal certeza, sugam o máximo de prazer do que tanto lhes faz bem. Amo em falsetes e vibratos, firulas muitas vezes desnecessárias, mas que enfeitam, embelezam. Amo em Rock, Pop, Indie e MPB, só não amo em Bossa Nova, prefiro amores mais agitados, calmaria não me excita. Amo ao vivo, sem playback. Amo para grandes plateias, estádios lotados, um público fiel e sedento pelo grande show, mas também sei amar acusticamente. Amo até sentir que já não amo tanto assim, que sei de cor cada letra, que a melodia já não emociona, aí me pergunto porque amei desmedidamente, porque não ingeri pequenas doses diárias, fazendo-o render. Me sinto a mais volúvel das mulheres, ou seria apenas meu gosto musical eclético se fazendo presente nas decisões do coração. O que sei é que os gritos, a euforia e os aplausos passam a ser ouvidos cada vez mais distante, o sucesso não é mais o mesmo, a música não é nada além de um amontoado de palavras que um dia fez sentido, ainda faz, só não me toca, não mais, desapego pode definir. Certa vez disseram ser autossabotagem, intolerância à profundidade, odiei tal colocação, mas concordei internamente. A incerteza do quanto dura, me faz exagerar na posologia e como toda droga, onde incluo o amor, em excesso, provoca até mesmo overdose. É como se me antecipasse ao fim, deixo de gostar antes de ser "desgostada", saio ilesa quase sempre, sem marcas e grandes lembranças. E o que esperar de uma velhice sem memórias? Acho que preciso viver um amor mais calmo. Poderia começar, quem sabe, ouvindo um pouco de Bossa Nova.