Intermezzo I

Quisera eu ainda ter forças pra criar uma distopia.

Meu sangue, minha carne é letargia.

- Revendo meu corpo e até minha alma.

Estive tanto tempo preso na angústia da esperança, que as glórias de uma vida mediana tangenciaram a esfera de minhas experiências.

Ah, quão inócuos são os sonhos medianos!

Não tive vida mediana. Como poderia, então, criar heterônimos funcionais, como fez o Poeta?

Minha Opus se perdeu em algum momento entre a chama do cadinho e o enxofre da mistura. Pela Arte, criei-me dois: Matei um deles.

Nem para envenenar-me de chumbo tenho forças agora. Sou um alquimista de sombras, um eremita entre os escombros da torre.

Pesado é o véu que cai sobre meu rosto, empurra-me a cabeça para baixo, a mortalha espessa separa-me eternamente das núpcias da vida e da morte.

Apenas vejo a luz distante da lanterna que eu mesmo seguro.

Ralph Heck
Enviado por Ralph Heck em 18/09/2015
Reeditado em 18/08/2016
Código do texto: T5387093
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