À um amigo
As portas do seu bar estavam fechadas esta manhã.
Alem de mim, seu porta voz
Estava lá desapontada
aquela senhora idosa que todos os dias aposta seus centavos;
Também estava, o homenzinho que te conta sempre as mesmas histórias;
Estava lá,
já com sintomas da abstinência;
De longe quem observava era aquele bebedor de cachaça que quer exclusividade,
que somente entra quando o bar está vazio;
Seus clientes costumeiros, todos estavam lá.
Coube a mim informa-los sobre sua ausência.,
Disse que seu bar logo logo reabrirá as portas;
Mas até não sei quando,
Você não estará aqui para me contar histórias de Ernesto Sabato,
de Cervantes e seu Quixote,
Nem me contará sobre o que você está achando da leitura de, O Tempo reencontrado, o livro de Proust que te emprestei;
Você não estará aqui para a gente conversar sobre os poemas de Cecília Meireles, de Florbela; de Adélia prado;
Nada de poesia, nada de prosa, nada de filosofía;
Você não estará aqui para me contar sobre o espetacular concerto de Mozart que ouvistes na noite anterior,
E sobre o playlist que você achou, com o melhor dos impressionistas.
Ou, simplesmente para falarmos sobre o tempo,
Sobre o país e da crise política, econômica e de valores pela qual atravessamos.
Eu disse para eles que ,
você ficará por uns tempos lá
com o seu corpo ancorado;
como um navio em reparo,
em um cais estranho.
Ficará lá cheio de tubos,
cercado por gente vestida de branco.
E que os aparelhos o ajudam a respirar,
Dizem eles.
Mas, que gosto de pensar ,
que sua alma de poeta caminha entre as árvores
de uma floresta distante,
ou navega por rios solitários;
Quem sabe ela sobrevoa o vale verde e
a várzea onde passastes a infância
e onde o sol nunca se põe.
Ficará por uns tempos lá seu corpo doente,
como um navio ferido.
E eu, seu amigo,
não posso fazer nada,
a não ser rezar e lhe dedicar
estas tolas palavras.
(Ao meu amigo Lemão, que sofreu estes dias um agressivo AVC.)