O que restou do começo
De repente eu estou em movimento
Mas algo em mim está mórbido
Imóvel,
Morto.
As casas se vão rapidamente com a velocidade do ônibus
Histórias que se passam em meus olhos voam com a força do vento
Eu sei que agora é tempo.
Tempo de me entregar àquele momento.
Momento de profunda sinceridade e franqueza
Comigo,
Com os meus sentimentos e pensamentos
E acertar as contas com as minhas fraquezas.
A fatura sempre chega.
Ela pode atrasar,
Ah, mas sempre chega.
É tempo de tentar descobrir quem eu deixei lá trás
Perdido novamente no tempo e no espaço do meu inconsciente
Ou será tempo de resgatar a voz daquela criança agoniada em dias de tormento?
Ela só quer chorar em silêncio
Ele se sente morto desde pequeno.
É tempo de voltar às memórias esquecidas
E lembrar quais dores ainda doem por dentro
Que sangram ainda em meu peito
Queimando-me por inteiro
Com todo o desespero.
Será que devo saber quem fui?
Para saber de quem é este rosto?
E este rosto?
Ele realmente é meu?
Eu me pertenço como penso?
Ou me apropriei de um mero personagem fajuto?
Será que eu tenho andado perdido todo esse tempo?
E tudo que eu escrevi e disse?
Serão os manifestos dos meus traumas e dos meus medos?
A linguagem do trauma sempre em segredo?
Pensando demais, eu me esqueço
Esquecido por mim, eu me afundo
Em águas doces e profundas no mar escuro da melancolia
Onde águas-vivas ganham vozes e me assombram
Dando vida a todos os de fantasmas que me prendem ao silêncio.
Então eu olho para trás com tristeza
E me pergunto:
Eu sou só a reação do medo que sempre tive?
Quem era esse que eu era antes de ser violentado pelo mundo?
Talvez eu tenha me transformado num personagem
Um personagem que luta contra os próprios pensamentos
Que insistem em jogar-me ao chão
Me condenando ao iminente fim miserável
Me entorpecendo antes de eu mesmo cair.
Ou talvez eu nunca encontre aquela criança doce
Encantada com o mundo e a magia exercida em plenitude na infância
Talvez ela tenha ido embora para outro lugar
Um lugar mais seguro talvez,
Quem sabe lá ela vive sua infância em paz?
Então concluo o que sou:
Uma angústia que adoece o meu existir
Que entorpece a alma e adoece a consciência
Que encontrou nas palavras uma salvação
Ou um refúgio para não enlouquecer,
Dando vida aos fantasmas que sempre me acompanham.
Eu sou o entulho que restou do começo.