Água furtada
Agora é quase nada, escasso fio correndo riacho correnteza abaixo.
Não sei onde me encaixo, aonde ancorar minhas palavras nesse minuto, diminutos grãos que espalho com minhas mãos miúdas sobre essa água tão furtada de mim.
Escôo colibris, fruta-pão, escôo jasmins.
Escôo meu olhar outrora damasco hoje um travo que desce à garganta, um tasco de lembrança que passa ardendo querendo fluir, querendo fruir desse quase nesse chão escorregadio onde eu piso folhas em remoinho, faço meu vinho, macero pétalas, deixo em infusão o meu coração amador, meus olhos quentes na confusão do calor.
Não sei prá onde vou se tudo agora é passado e me encontro no vago, no abstrato onde o meu tato foge em arcos que passam rentes pelas lentes que embaçam, pelo que não conheço passam disfarces, disformes, mágicos, passam rápidos, intrépidos, ávidos, passam aves, passam asas na minha face, meu lábio branco na cor do canto que vem da rua, canto de lira, de lírio do campo, cor do espanto, do grito que escoa mudo, passa o absurdo que me acena lúdico, me encara lúcido.
É luz madrugada nessa água furtada sou nada e nadam minhas palavras, dançam solo, deslizam ventre, escoam mudas cachoeiras, escassas mudas que respiram rosas dos ventos, em espirais respiram à beira do que eu não sou capaz.