Sobressalto
Assim que o vi levei um susto.
Um susto leve, mas com barulho suficiente pra acordar meus versos sonâmbulos
As palavras caladas por tanto tempo pulsavam forte, dando voz ao coração inquieto.
Talvez a inquietude pudesse ser atribuída ao susto ou à visão magistral de um sorriso que perante meus olhos incrédulos evocava o amor, e no altar da poesia celebrava a vida de forma encantadora e transparente.
Talvez os dois ao mesmo tempo, talvez não.
Juro que naquele instante senti vontade que me calasse.
Embora a boca estivesse absolutamente fechada,
o coração barulhento enfatizava cada palavra que a boca ocultou, e denunciava-me a cada gesto.
Atônita não entendia tudo aquilo que transbordava em mim, ou fingia não entender com medo de sentir. Se entendesse estaria condenando a mim a concretude, ao transbordamento do meu universo poético que dormia sob a lápide da imaterialidade.
Em um gole lento bebi o desejo de acordar a poesia do teu corpo. Ainda sóbria sobrevoei mansamente a fronteira da sua intimidade, a fímbria mansa do seu coração, admirando a misteriosa e bela silhueta que desfilava displicente perante meus olhos ébrios.
(Edna Frigato)