DESAMPARO CÓSMICO
Nunca pensei em levantar cedo pra ver o nascer do sol, até que me disseram...
Sempre vivi na melancolia do crepúsculo, na finitude dos dias, no acabar das 24 horas...
Teria eu uma alma melancólica?
Uma alma de fim?
Porque o ocaso tanto me apraz?
Porque essa endógena melancolia de passado?
Se posso sentir alegria no amanhecer porque não permitir-me?
Qualquer dia destes vou acordar cedo e “pegar o sol com a mão”, à beira do rio que circunda minha morada.
Sentir o aroma matinal.
Encher-me de luz.
Fartar-me de amanhecer...
Talvez isso me subtraia do entardecer,
do desamparo do fim de tarde e eu possa sair da guarida
que me "protege" dos dias fluidos...
Talvez mude meu olhar de fim, para olhar de começo, e assim possa abrir novos ciclos e florir como as acácias do vizinho... talvez ame outra vez... e mais outras...
E amando possa sentir-me como pássaros num fio, se amando por um fio, literalmente...
Amor fluido, leve, feito pluma e ao mesmo tempo intenso,
no apoucado instante do encontro.
E me perguntaria: Seria o amor fio tênue, vibrante, energizante?
Condição "sine qua non" se possa viver?
Talvez amor esteja no preenchimento desse desamparo cósmico,
dessa visceral necessidade de fruição e recomeços,
nessa absoluta vida epitelial que me reveste. Amor pele. Amor semente que adormece e não fenece na aridez dos fins...
(Suerdes Viana)