Num passado qualquer...
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O tronco era grosso e forte - ao menos parecia - naquela árvore frondosa já se sentia. Fora o marco da existencia de tantas paixões avassaladoras muitas das vezes com dores que até a sua seiva escorria do casco rugoso - era o choro dos casais - era o adeus, era a esperança, era o tudo e até era o nada.
Era... Era...
Por muitas vezes deixou-se ficar e murmurar coisas que jamais faria na intimidade do quarto. E revelava os segredos e os desejos não contidos. Falava dos beijos e daqueles que teriam sido ardentes e dos que beijavam sem a língua. Era a tirania da fofoca - segredinhos perto das folhas - ao pé do ouvido. E a brisa suave acariciava os cabelos daquela moça.
E muitas das vezes a noite já sobrepunha o seu cobertor acinzentado enquanto as sombras desfilavam perversas com o uivo dos lobos à sua janela. E os galhos da velha árvore tocavam de leve a vidraça. Era a cena do amor que doía no caule; que doía na pele; que doía até nas frutas rosadas de tanta paixão.
Um belo dia ela encontrou alguém que lhe tirara o fôlego. De um beijo gostoso e longo, macio como as nuvens e molhado como as águas das frutas quando pingavam da chuva. Ela gostou tanto que marcou com o canivete no tronco grosso da velha árvore - colocou a data e o ano e desenhou dois corações.
Hoje ela voltou na velha árvore que naquela época aprovara o seu desenho e o seu segredo de paixão. A árvore continua linda, mas com os frutos pequenos, está mais cinza, os galhos mais caídos porém de pé. Depois de tanto tempo, ela voltou para transfixar a flecha nos dois corações quando a dor a mutilou: a seiva embaciada de sua amiga sangrou.
Coldplay - Paradise
(https://youtu.be/1G4isv_Fylg)