QUILOMBOLAS
QUILOMBOLAS
Marcope
O8/03/2015
Existe um povo que a bandeira empresta
Para cobrir tanta infâmia e covardia...
Navio Negreiro – Antonio de Castro Alves.
Para limpar essa mácula
Do auriverde pendão da minha terra,
Espremido pela pressão social,
O Governo Imperial
Deu à luz
Em treze de maio de mil, oitocentos e oitenta e oito.
Uma lei com dois artigos.
Cada artigo, uma oração.
A Princesa Imperial Regente
E o Conselheiro Rodrigo Augusto da Silva
Subscreveram
O importante diploma legal que diz:
Art. 1º. É declarada extincta desde a data desta lei a escravidão no Brazil.
Art. 2º. Revogam-se as disposições em contrário.
A lei salvadora de nossa moral
Recebeu o número três mil, trezentos e cinquenta e três.
Abriu-se a porta da senzala
Mas os libertos não lograram
Transpor a soleira da casa grande,
Impedidos pelas regras sociais.
Criou-se daí o preconceito social
Com todas as suas consequências
Que até hoje perseguem
A continuidade de uma raça.
A escravidão, pois, continuou
E ainda persiste sob as mais diversas formas
Afastando os afrodescendentes
Das chamadas elites sociais,
Segregados nas favelas e nos presídios.
Lentamente, a libertação está chegando
Pelo esporte e pela arte
Mormente o futebol e a música popular
Que têm levado alguma luz
À espezinhada raça
Cujos filhos compulsoriamente trazidos
Nus e acorrentados
Amontoados nos porões negreiros,
Meses e meses, desde a África até o Brasil,
Misturados aos próprios dejetos
Aos restos de comida que lhes era jogada
E aos cadáveres dos que sucumbiam
Ante o peso de tanta desgraça.
Aqui foram animalizados e vendidos.
Tornaram-se propriedade dos ricos,
Perdendo tudo,
Inclusive o direito ao próprio corpo e à vida,
E até ao pensamento.
Cativos sob o peso da chibata,
Não podiam, sequer,
Adorar os seus DEUSES..
Prática comum entre os donos de escravos,
O mais degradante de todos os maus tratos
Que se impunha às mulheres cativas,
Era a utilização de reprodutores,
Cuja função principal
Era engravidar as escravas
Tão logo atingiam a puberdade
Para que dessem à luz
Filhos de maior valor no mercado.
Era dever do reprodutor
Engravidar as mulheres
Tão logo os bebês pudessem ser desmamados,
Propiciando aos abutres escravagistas
Lucros extraordinários.
As mulheres (de menor valor no mercado)
Eram mantidas para criar filhos
E os homens eram vendidos.
Cada filho levado pelo novo dono
Era como se arrancasse um pedaço
Do coração da mãe,
Fato que se repetida a cada ano,
Enquanto ela tivesse força para procriar.
Massacrados pela maldade dos senhores,
Que muitas vezes se compraziam em torturar
Fazendo dessa barbárie uma diversão,
Homens de brio dentre os cativos
Começaram a fugir,
Fugas quase sempre mal sucedidas
Ante a ferocidade que eram caçados
Pelos capitães do mato.
Recapturados, eram castigados no tronco,
No rigor do sol quente,
Sem comer e sem beber,
Muitos morriam ante a crueldade do castigo.
Ante os fracassos individuais
Surgiram as fugas coletivas e planejadas
Para lugares de difícil acesso
Onde, organizados, podiam rechaçar eficientemente
Os caçadores de escravos
Dessa prática, surgiram os quilombos
Onde os fugitivos se escondiam
E organizavam a defesa,
Onde as batalhas eram travadas
E na maioria das vezes vencidas
Fugitivos que preferiam morrer
A voltar para a escravidão.
Muitos quilombos foram bem sucedidos
E hoje seus descendentes
- os quilombolas –
Gozam da proteção legal do Estado Brasileiro.
Exemplo disso
A Associação dos Quilombolas de Uruaçu
Que além de um bom e útil atelier
Que é fonte de renda para aqueles que ali trabalham
E produzem excelentes artesanatos,
Já conseguiu, a Associação,
Dezenas de casas de moradas
Isso é pouco, muito pouco,
Quase nada, diante da enorme dívida social
Que o Brasil tem para com a raça
Que com seu trabalho,
Muita dor e sofrimento
Fez este Brasil gigante.
Em paga, escravizou, torturou e matou,
E concluiu sua obra destruidora
Orquestrando odiosa discriminação social
Consubstanciada em racismo preconceituoso,
Camuflado e protegido
Por aviltantes regras sociais,
Que amparam seus algozes-descendentes