Cinco Horas

Era para terem ficado juntos apenas por uma hora, e já se passavam das cinco da manhã.

- "Amanhã o dia é cheio, era pra eu estar dormindo!" Pensaram os dois simultânea e inconscientemente. Mas estavam ali porque, mesmo assim, era o melhor para ambos.

Arrumou as roupas, recompôs o fôlego, e restabeleceu as pernas. Bem. Pelo menos tentou.

Aos beijos, atravessava o portão não querendo ir embora. E ela não deixando-o ir. Sabem que um dia verão o sol nascer no inverno.

Ao bater o portão, vem novamente o pensamento que tiveram após terminar de se entregarem:

- "Será que noa ouviram?". A final, é praticamente impossível se lembrar do quão alto de fato foram os gemidos, tapas e gritos. Na hora do prazer, talvez seja a última coisa que se passa na cabeça em sua cabeça (se é que se passa).

Antes de se virar, coloca o capuz. Olha com cautela. O medo de alguém estar vendo é iminente. Na verdade, há alguém olhando. Pois sabe que ela sempre fica ali um tempinho, escondida atrás do muro, bisbilhotando-o ir embora.

Colocou os fones, e cada passo é uma preocupação. A hora, o segredo, a lei.

A neblina é densa e linda, combinando com o clima de mistério que os ronda. Antes de sair de vez, ambos a observam separados.

- "Parece um filme de terror!" Disse ela no sorriso largo de criança que carrega.

- "E dos bons." A completou, como é de praxe.

A vontade de ter se beijado ali e não poderem relembrou dois dias atrás, quando se despediram em público e também não o puderam fazer.

Com passos macios, olhos atentos e pupilas dilatadas (e coração apertado), seguia o caminho para casa. Não moram tão longe um do outro. Mas quando se está tenso, cada passo dado é uma missão cumprida.

Numa rua de paralelepípedo, paralela à principal, uma viatura se aproxima. Com o farol desligado e bem de vagar.

- "É agora. Descobriram! O que faço? Será q e estavam nos vigiando. Algum policial à paisana estava de tocaia me esperando sair e acionou alguém para me encurralar?" Pensou desesperado, e continuou: "Calma. Aja naturalmente. (...) Mas como agir naturalmente? Sei que é um crime, mas apenas nós dois sabemos. Será que há como descobrir apenas com duas semanas e meia? Será que dei pistas? (...) Calma. Continue andando."

E continuou. Quando chegou a avenida e notou que a viatura tomou o sentido contrário ao seu, o alívio. Após, um suspiro.

- "Que besteira. É crime se entregar às vontades? É crime se sentir bem quando não faz mal a ninguém? E é crime quando tudo isso é recíproco?".

Pensou nessa frase (que escrevera em uma de suas poesias) enquanto abria os olhos e vira um clarão no céu.

-" O tempo passou tão rápido que nem notei o sol nascer. Mas espera! Como diabos o sol está nascendo no oeste?!"

Assim notou que era a lua iluminando o seu caminho e acalmando sua face. Tão cheia, dourada e maior que o normal, que parecia, de fato, o sol nascendo, brincando de colorir o céu num tom roxo e laranja que, não fosse a hora e a circunstância, seria difícil distinguir entre alvorada e ocaso. Sua vontade, ao ver aquela perfeição, aquela pintura realista gigante, era de correr de volta para a casa dela, pegar em sua mão pequena e levá-la para ver (já que algumas muitas horas antes, tinha dito a ele o quão linda e brilhante a lua estava, porém, ainda quase no topo do céu).

Atravessou a avenida e seguiu seu atalho rotineiro para casa. Com pernas cansadas e doloridas, pisava e suspirava. Girou a tranca do portão de casa lentamente para não acordar os parentes que estavam dormindo (assim esperava) e não sabiam do seu paradeiro (e nem iriam saber). Foi rápido para o banheiro, para se limpar da lambança deliciosa que fizeram juntos. Tomava banho e se esfregava frustrado, pois queria as mãos dela o limpando (ou sujando de novo) e vice versa.

Foi nu para o quarto lembrando do quão belo era o corpo dela - coisa que fazia questão de admirar e falar. Via seu corpo (perna, seios, quadril, mãos, braços, boca e cabelo) despido de culturas e pudores tal qual um artista renascentista olhava o fim da sua obra mais famosa (como explicara a ela duas semanas antes).

No quarto, vestiu-se. Cobriu-se conversando rápido e despedindo-se dela pelo celular. Adorando a reconciliação que fizeram após a decepção que um causou ao outro - após uma noite de palavras bonitas e uma tarde com um telefonema que não reflete a mesma. Se irá confiar nela como antes..., ainda não sabe.

Mas sua certeza, naquela noite, naquele momento, era certa:

- "Ah, como esse risco todo valeu e vale a pena!". Sussurrou para si mesmo num riso torto, enquanto fechava os olhos e esperava sonhar com as ultimas cinco horas.

Luan Tófano
Enviado por Luan Tófano em 08/05/2015
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