Tempo inclemente
Tenho impressão que me apaixonei por uma entidade cósmica
de massa incalculável, tal minha atração por ela.
Tal a distorção que causa, no tempo e no espaço.
Não sei o que acontece, mas quando estou com ela, tempo nenhum parece ser suficiente.
As horas passam de forma diferente, num ritmo que não entendo.
As vezes, mesmo distante, sinto-a comigo.
Minha vida parece um retalho, picotado e remendado. Um filme mal feito onde as cenas de nossos encontros são espaçados por horas e horas de fatos cotidianos desnecessários e tediosos.
Tenho essa impressão, que quase me incomoda quando ela está longe. Mas quando está comigo nada disso existe.
Tudo que existe é o cheiro dela e os arrepios que me causa quando me beija o pescoço.
Só existe a pele dela, mais quente que o normal. E sua expressão levemente irritada quando bagunço seus cabelos.
Só existe seu gosto em meus lábios e o peso do seu corpo sobre o meu.
Também existem as brigas... angustiantes... e o medo que ela vá embora.
medo do vazio que se seguiria e ocuparia minha existência, frente ao espaço que já é dela em minha cabeça.
Medo de nossas palavras sem acerto, que insistimos em trocar quando discordamos de algo.
Medo do medo dela. Medo que ela procure a saída mais fácil, como tantas outras já fizeram.
Medo que ela simplifique tudo e fuja.
E as vezes o medo parece maior o do que eu mesmo... mas nunca maior do que ela...
Quando a tenho comigo não existe nada, além de nós dois.
Além de nossos corpos, orbitando em torno de um ponto comum
num encontro que podia ser eterno,
se não existisse o tempo, inclemente
que teima em nos separar.