Nada me pertence
Nada me pertence.
O meu próprio eu não me pertence
Pois o que me define para os outros
É metade a maneira que pareço ser
Com a metade que presumem que eu seja
No cinza entendimento;
Do outro lado sofro estar como parte daquilo
Que faço, de onde me apraz estar até presente momento,
Agora aquele íntimo eu que não se mostra
Jamais permitiu vestir-se de certeza,
Todas as vezes que isso aconteceu
A surpresa rasgou roupas, queimou máscaras
E espantou qualquer verdade pressuposta
Fazendo com que esse íntimo seja indefinido, um mistério para mim.
Mas que pobreza definir-me, definir qualquer pessoa!
Definir é dar corpo ao que é grande demais
Para caber em um corpo ou o que é pequeno demais
Para formar uma letra sequer, ou não tem tamanho nenhum
E por isso não cabe na palavra tudo e nem na palavra nada,
Definir é definhar o vigor de uma alma em um corpo doente de certeza,
Definir serve somente para termos uma ideia de identidade
E facilitar a comunicação entre as coisas, deixem que cátedras categóricas defina as coisas,
A epistemología que morra de indigestão numa antropofagia de seus termos,
Ela diz tanto a verdade quanto minha hipocrisia consciente
Que condena todos os termos que acabei de usar,
Mas se eu afogar de sentidos que seja com a antologia das flores do indefinido
Plantadas na fantasia onírica de uma criança cega,
Que seja pela mistura do licor de Ágape com o vinho de Eros
Me embriagando no indômito amor perto do coração selvagem
Quero acabar-me em uma orgia dionisíaca com o sol de Apolo nos olhos
E ser desmembrado por vontade própria pelas bacantes,
Mas não me venham dar novamente um corpo!
Não quero a pálida verdade de um escopo redigidos por olhos pressupostos,
Quero a loucura lucidamente lúdica de desejos ainda não descobertos
Que jamais serão meus ou seus, mas que constroem o infinito somente no agora.
05/05/2015