DA LEVEZA... IMPOSSÍVEL
           REPUBLICAÇÃO - TEXTO DE 06 OUTUBRO DE 2012



                                       
    Tudo o que ela ainda gostaria de poder encontrar e dela tentar manter o possível, seria alguma leveza, da leveza que nela existiu desde sempre, mas que foi sendo, desde sempre, progressivamente amordaçada por todas as mordaças possíveis, da mais vária natureza, e isso não mudou nunca, só foi sempre re-acontecendo com padrões novos, insuspeitados, alguns de inacreditável sutileza e/ou semi-inconscientes por parte de agentes inocentes do poder de sua própria ação. Alguma leveza ainda queria, mas, suas asas, ao longo da vida e dos anos foram sendo cada vez mais feridas, uma delas, a esquerda, a do lado do coração, foi mesmo semi-arrancada, há tanto tempo, com tal violência, que ela já quase não sabe mais voar sequer pelo pensamento – Existe transplante para asas, amigos?   Isso não é ironia, se o for é tão triste ironia que nem seja possível chamá-la assim.
        O Recanto é lugar onde ela ainda voa o possível, dentro do possível. Conseguiu conservar o coração, para os amigos. Para o amor... o amor é outro departamento e, talvez, para sempre e deveras interditado. Acho, acho... que ela tem algo de poeta, então “sua” poesia ainda consegue voar um pouco, mesmo  com a asa direita ferida e a esquerda semi-arrancada há muito, há muito tempo. Pássaro-mostrengo, de mitologia sem pátria e sem antecessores no que se refere a espécies, ela ainda consegue lembrar-se um pouco, um pouco... do tempo de seus deuses, vivos ainda, em algum Olimpo. Mais bonito seja dizer dela, não pássaro-mostrengo – isso é tão feio, pesado - mas, pássaro ferido, simplesmente, eu diria, quase sem faltar a verdade: sem metáforas. É menos jocoso, e mais poético. Sem nenhuma ironia, amigos. Sem  ironia nenhuma.
       Ainda existe a paineira, bem diante da janela. Precisa ser podada (nunca o foi até hoje) porque está grande demais e suas raízes já abalaram o solo em volta. Temo por ela e também por nós, os habitantes do “meu” prédio e dos prédios ao redor. Se não for podada,  pouco que seja, isto pode se tornar perigoso, para ela, paineira, para os prédios, para nós todos, por causa das tempestades de verão.

        Esse último parágrafo não é metáfora, certamente não o é, corresponde a mais evidente das realidades. A árvore, a "minha", a  paineira de todos, precisa ser um pouco podada, por amor. Por amor.



                      Na manhã de 06 de outubro de 2012.