LEMBRANÇAS EM 3D

As agulhas de tricô passeavam ágeis pelos seus dedos miúdos.
Não, ela não tricotava somente malhas, casacos, enxovais de bebê. Das suas mãos desprendiam energias da melhor qualidade, junto com cada ponto ela acrescentava seu carinho, para a pessoa a qual destinava, a peça que tricotava.

Eu gostava muito de vê-la tricotar, muitas vezes a ouvia suspirar, enquanto os pontos corriam por entre as agulhas.
Às vezes, ela levantava os olhos dos fios coloridos, e seu olhar vagava pela paisagem verde que cercava nossa varanda rústica.
Hoje, sei, que nesses momentos em que o seu corpo, ali ficava estático, sua alma buscava Deus.
Em seguida, ela voltava, e me olhava cheia de amor, então acariciava com ternura infinita, meus cabelos longos e lisos, e me perguntava se eu queria que ela tecesse neles uma ou duas tranças.

Faz tanto tempo, que essas cenas aconteceram, mais de cinquenta anos, mais de meio século. E, eu me pergunto, como posso vê-las tão claramente nas retinas das minhas recordações?
A saudade é responsável por desenrolar tubos de filmes envelhecidos, mas, em bom estado, que guardo acondicionados dentro da minha alma.
Na tela das minhas lembranças a projeção não tem hora para acontecer. E assisto em 3D, pois, além de ver com nitidez, sinto o perfume, e as carícias das mãos delicadas de minha mãe, sobre os meus cabelos, que hoje, estão embranquecidos e não são mais longos.




(Imagem: Lenapena)
Lenapena
Enviado por Lenapena em 21/04/2015
Reeditado em 21/04/2015
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