LIRISMO DE UMA SONHADORA

LIRISMO DE UMA SONHADORA

Desde a mais tenra idade

Esta é uma simples verdade

Suportando humilhação

Desestímulo e agressão

Seguia esguia menina

Ainda flor em botão.

A solidão a forçou a autossuficiência

E como autodefesa, arrogância,

E sem considerar sua condição de criança

Na maioria das circunstâncias

Seu equivocado perfil era fortemente criticado

Mesmo assim, persistentemente implorava por afeto

Embora de longe ou de perto,

Seu desejo lhe fosse negado

Por isso seu objetivo era ir embora

Fugir para bem longe dali

Buscar por outros territórios

Onde pudesse crescer

Depois de conseguir ser "gente"

Uma vez que "gente" não se sentia ser

Escolheria uma profissão

Mas teria que ser uma profissão inovadora

Não foi difícil decidir

Que almejava ser professora.

Sem mais delongas, antes dos 13 anos partiu.

Seus sonhos eram estudar

Mais como estudaria?

Sem antes aprender trabalhar?

Não tinha nada que soubesse fazer

Para que pudesse se sustentar!

Não roubava, era do bem.

Mas a vaidade moral e a covardia lhes impediam também!

Pedir esmola? Pediu!

Mas, isso lhe castigava como ninguém

Prostituir-se? Nunca pensou nisso, mas tal vez fosse uma opção...

Mesmo porque a situação era propícia para tanto

Todavia seu biotipo

Não possuía atributos contanto.

A fome roubava-lhe as forças

O frio lhe açoitava, porém

Numa dessas noites tristes

Dessas que dilacera a alma de alguém

Pobre florzinha murcha, sem recursos

Pediu socorro à FEBEM

Embora ninguém lhe desse crédito

Ela acreditava em sua capacidade

E o significado das siglas F E B E M

Já havia decorado

E se lá, provinha o bem estar do menor,

Estudaria, estudaria de verdade

Jamais duvidando que somente por esse viés

Se aproximaria da prosperidade.

Inocente ilusão,

Lá ela conheceu o inferno

Ou melhor, o inferno já conhecia!

O conheceu agora, sem margens, sem limites e sem chão.

Prensado e compactado pelo impacto da desilusão.

No entanto, por não ser infratora.

Brevemente à sociedade retornou

E a sarjeta em seus afetos

Em seu leito a aconchegou.

Sem outra saída, saciou-se

Com os alimentos dos lixos

Disputou com cachorros e gatos

Os restos dos finais das feiras...

Enfim, numa noite de intenso frio,

Embalada pelos soluços dormiu,

E naquele sono, insano sonhou ser cantora...

No entanto, ao despertar no aconchego dos braços da rua “dice”

- Não, serei professora!

O tempo avançou vagarosamente

Com lágrimas, suores e ranger de dentes,

Se constituiu finalmente

A condição de se fortalece o suficiente

Para cometer um assalto moral

Onde conseguiu a fórceps arrancar das entranhas de seu ser e trazer com sigo sua autoestima

Que anestesiada dormia aos farrapos

Enredada pelas malhas da humilhação

Da rejeição, do abandono e dos maus tratos...

Aos poucos foi se amadurecendo na amargura

Mas amargurada não se tornou

E ao final da década de noventa

No Magistério se formou.

Essa menina mulher, senhora solo

Que abraça a solitude por falta de opção

Segue nesse território solitário, oscilando entre ser semente ou plantadeira,

Apesar disso, percebe aqueles que a excluíam reconhecendo:

Esta mulher é guerrilheira...

Em regência escolhe entender o território escolar

Como um jardim de diversidades e variedades

de botões e flores encantadoras...

E em sua simplicidade continua liderando seus passos, avançando em direção a se tornar uma provedora.

A final é com muito orgulho que diz:

- Sim! Eu sou professora.

Não obstante, me reconheço leiga, por isso solicito,

Que perdoem-me as falhas por ventura percebidas

Uma vez que no universo da língua falada ou escrita

Permaneço criança ainda.

Porém confesso que almejo crescer e sei que cresço

Embora num ritmo um tanto lento

Consciente de que apenas engatinho

Pela periferia do conhecimento.

E se não ficou claro

O porquê do esforço

E do orgulho de ter conseguido me tornar professora!

É porque desconheço neste sistema,

Profissão mais promissora.

Maria Márcia