Menina Moça
De minha infância tenho muitas recordações, algumas são até engraçadas, e às vezes me apanho divagando por entre elas sem permitir compartilhamento. Mamãe às vezes me surpreendia nestas lembranças e dizia do que você está rindo menina? E eu envergonhada mudando a fisionomia respondia: nada não senhora, tentando voltar à compostura.
- Ora então deixe de ser lerda e pare de ficar aí rindo sozinha que nem uma besta.
Mas o que vem ao caso que sorria até a barriga doer, não repare sou meio besta como ela dizia; é quando ia à venda do “Sô Jao”, buscar querosene para de noite acender as lamparinas. Sempre deixava para ir pela noitinha, não queria ser vista pelos colegas do ginásio com a garrafinha do combustível. Então para não tropeçar e quebrar o vasilhame de vidro tirava o chinelo feito de sapato velho e disparava numa carreira só.
Naquela época era difícil para uma criança entender as realidades da vida de uma família liderada por uma lavadeira. E tentava esconder o mais que podia a sua pobreza, através da extroversão na sala de aula, lá ela era igual a todos e na hora das notas às vezes até melhor. Sua dificuldade estava em compreender por que na casa de seus amigos tinha luz elétrica, televisão, geladeira, fogão a gás e na dela nem um lampião.
Mas voltando aos fatos pitorescos, mas nem sempre inusitados, do tempo de menina, parece que transcende no tempo e no espaço e acompanha a pobrezinha certa feita indo à venda ao cair da tarde. Mesmo ao escurecer percebe que algo em seu corpinho de menina estava chamando a atenção mais do que o de costume, justamente quando colocava a sainha de godê e a blusinha cacharel bem gasta. Então envergonhada e cabisbaixa cruzava os braços para ninguém perceber que estava virando moça.