[Aqueles pássaros emudecidos]
No fulgor do céu ensolarado de Goiás, os pássaros ainda cantavam... E ao cair da tarde, boca da noite, o seu canto demudava em breves piados: recolhiam-se para o pouso. E no escuro da copa da enorme mangueira do meu quintal, eram já "pássaros anoitecidos", recolhidos, e o seu canto, apenas silenciado.
Ah, mas aquela mangueira... Em dias de chuva pesada, era habitada, naquele tempo eu tinha certeza, pelo próprio Demônio! Passada a chuva tempestuosa, no dia seguinte, no chão, em meio à galharada caída, aquela tristeza sem remédio: a gente via os cadáveres dos pássaros derrubados da mangueira, mortos pela tempestade... O pouso na mangueira era a via da Morte, e agora, aqueles eram pássaros emudecidos... para sempre!
E tudo isso para dar razão a Spinoza: "deus", ou seja a Natureza, não ama nada, não ama ninguém! Deus e o Demônio são apenas figurações dos medrosos, os que tremem ante a ideia da aniquilação fatal! Mas o Demo, se existisse, seria mais honesto, mais coerente, e em alguns casos, mais até mais excitante...
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[Desterro, 31 de janeiro de 2015]