Só nós, Deus e as estrelas _ Casa da Selva
Entendi. Pra pensar, lembrar não precisa estar conectada. Então vamos lá. Era noite, antes de ontem. Cheguei com o grande pano azul e estendi-o no chão, sobre a relva, para deitar-me. Água fresca, lanterna e almofada feita travesseiro. Olhei pra cima e deslumbrei-me.
Era muita estrela! Era o que eu queria, mas não suspeitei que fossem tantas! E Deus falou: _ Tó. Ele não falou 'tomai', nem 'tome', nem 'toma'. Ele falava comigo, e a linguagem era coloquial. Eu disse: _São muitas! Quase disse:_Não precisava tantas! Mas Deus ia saber que eu queria todas.
Deitei-me. Deitamos, porque eu não estava só, e as estrelas, ali, nos maravilhando. Inebriei-me delas. Por mais de hora fiquei a ver estrelas no melhor sentido que isso possa ter. E conversamos, colocamos algumas palavras no meio do silêncio contemplativo e nos lembramos de coisas diferentes, porque nossas infâncias e histórias haviam sido diferentes. De vez em quando alguma estrelinha andava rápido, mas víamos logo, não era estrela, era avião. Aviões cortaram o céu em várias direções.
E meu companheiro, relacionamento sério, quem pode dizer que não, se somos casados e temos dois filhos homens_ quem pode dizer que não é sério?_ como dizia, meu companheiro às vezes via as pequenas luzes dos aviões antes que eu e me avisava. E ficamos, ficamos. Não o ficar de hoje em dia, o de antigamente, só que com muitas estrelas. Quando fomos recolher travesseiros, água, lanterna e o imenso pano azul-escuro do chão, quis puxar pela ponta também o imenso pano azul-escuro do céu carregado de estrelas, mas Deus falou: _Deixa.
Eu tornei a colocar a ponta do céu no mesmo lugar de onde havia tirado e Deus alisou a parte enrugada que eu não soubera esticar. Viemos pra dentro e dormimos. Ontem, mesma coisa, só que havia menos estrelas, mas foi bem bonito de contemplar.
Este texto também nasceu no Face, na Casa da Selva.